segunda-feira, julho 23, 2007

Volver

Voltei de mais um encontro de estudantes de design. Por uma conjunção maravilhosa de fatores, foi de longe, mais especial de todos. Muitas coisas foram especiais, e, como constava na proposta, a mais mais foram as próprias pessoas.
Dessa vez não conheci tanta gente nova, ainda que ter reforçado laços antes tênues seja proveitoso o suficiente para um encontro valer a pena. Mas conheci pessoas sim, uma em especial. Me envolvi, para variar, e mais uma vez voltei para casa com a mente confusa e o coração descompassado.

Me envolvi também com idéias. Muitas idéias, de colegas, de palestrantes, e algumas minhas, que surpreenderam, confesso. Quando se está rodeado de seres pensantes, com vontade de refletir, discutir e chegar a algum lugar com seus raciocínios, ao contrário do que acontece na rotina daqui, parece que meu próprio cérebro se inspira e revela seu potencial.
Talvez por comoção com tudo o que estava sendo dito e pensado, talvez por pura vontade de impressionar pessoas tão inteligentes e especiais que, ao serem tão interessantes quase me desafiavam a acompanhá-las, tive momentos deliciosos que me levaram a conclusões bastante proveitosas.

Nessa semana que passei em Floripa, bebi muito, dancei muito, beijei muito e ri horrores, mas talvez o que eu mais tenha feito, ou pelo menos é o que fica de mais significativo pra auto-posteridade, foi pensar. Argumentei com pessoas que eu mal conhecia sobre tantos assuntos, ouvi opiniões tão ricas e diversas... Saí de algumas conversas, que ocorreram não só nos espaços "oficiais" de discussão, os balaios, mas também nos corredores e gramados da UFSC, com verdadeiras bibliografias, listas de referências de autores, temas, questões a serem estudadas e aprofundadas.

Me senti pequena perto de tantas pessoas interessantes e suas idéias complexas. Pequena pela falta de leitura, pela preguiça de estudar, de desenhar, de escrever, pela pouca vergonha na cara mesmo que às vezes me cola a cara numa TV cheia de enlatados. Mas também me senti grande, quando vi o quanto eu posso fazer, o quanto podemos todos. Lógico que comparar-se a alguém formado, ou em vias de, é submeter-se a julgamentos injustos. Tenho um caminho imenso pela frente, e muito tempo pra chegar a algum lugar.
O melhor mérito desse N, portanto, não preciso dizer que sob o meu ponto de vista, foi ter me despertado essa vontade, há algum tempo adormecida por preocupações menores, talvez até burocrátias de uma vidinha universitária que às vezes beira a mediocridade. Mas agora os quereres voltaram, e dessa vez não são desejos bobos nem caprichos momentâneos. Agora são vontades maiores, de algo grandioso, não em relação ao mundo, mas que faz muito sentido pra mim. Consegui lavar a alma de coisas até um pouco estúpidas que antes me preocupavam. Abri meus olhos para questões que realmente importam.

Relendo esses parágrafos, reconheço o tom sonhador e até ingênuo que transborda no texto. Mas começo a achar que ingênuo é bom, considerando-se as circunstâncias. Alguém com tão pouca idade e tanto de faculdade pela frente, pra não falar com tanto de vida, não deveria se deixar dominar pela neurose de soar profissional, que me parece até um pouco ridícula.

Era pra ser um texto sobre o N, e acabou virando uma divagação sobre a natureza dos meus próprios textos. Me parece adequado. Ninguém lê esse blog, anyway, o que me dá muita liberdade de exercitar algo que um dia talvez me leve a algum lugar. Sim, porque eu estou sempre querendo chegar a algum lugar. Voltando ao tema do N, esse encontro me confirmou o que eu vinha sentindo há anos, toda vez que viajo. Que esse conceito de lar, na verdade me é muito estranho, tendo em vista que eu nunca me sinto tão bem em casa como eu posso me sentir num albergue barulhento ou numa barraca úmida.
Não que eu não preze o que tenho aqui. Sem falar de mãe, amigos mais que especiais e todas essas coisas que me rodeiam, pelas quais confesso ser bastante apegada, tem muitas cisas de que eu gosto na minha vida no Rio. Mas tem alguma coisa que me faz sentir tão bem quando estou fora... não é a euforia de viajar, de ir às festas, nem nada, eu nem sou a pessoa mais animada do mundo, acabo dormindo cedo às vezes... Falo de uma sensação de liberdade, de plenitude mesmo, de se sentir completo quando não se tem mais que o essencial, quando se é obrigado a se virar sozinho, de ser autêntico quando se pode vestir qualquer personagem.
Estar rodeado de estranhos te permite dizer o que quiser, reinventar-se a cada bom dia. Posso estar enganada, mas tenho a sensação de que nunca sou tão sincera quanto posso ser com esses estranhos, talvez simplesmente por não ter medo do que possam pensar essas pessoas que eu não terei que rever no dia seguinte.

Agora começam a fazer sentido algumas referências, me vêm à cabeça cenas de filmes, falas de personagens que sempre me encantaram. Não cabe citá-los, mas cabe dizer que o exercício de auto-conhecimento nunca me pareceu tão rico. Podem chamar de egotrip, mas não me importa. Em Floripa mesmo me aconselharam a investir em me conhecer, em buscar em mim mesma as respostas, em dar valor à felicidade das pessoas grandes. É o que pretendo fazer, a partir de agora. Mais importante que vaidades, paixonites ou assuntos alheios, agora eu quero pensar no que realmente me importa.

Várias questões ficam levantadas depois desse N. Algumas são conceituais e eu posso buscar as respostas em livros e discussões, ou, principalmente, nas minhas próprias reflexões. Outras vão ser respondidas com o tempo, ou por outras pessoas, por serem de outra natureza e exigirem atitudes, vontades e sentimentos fora do meu alcance. Sem falar nas inspirações que surgiram relacionadas a design, ensino, pesquisa, eventos, etc etc. Não sei quanto tempo vou levar pra digerir tudo isso, não sei sequer se algum dia vou chegar a realizar tudo que esse N me despertou. Mas o importante às vezes não são as respostas, e sim as questões. E, sem sombra de dúvidas, esse foi o N dos questionamentos.

Não sei se foram as pessoas que se adequaram perfeitamente às circunstâncias ou o contrário, mas poucas coisas nesse N poderiam ter se passado melhor para mim. Espero que a organização tenha idéia do que tudo isso significa. Eu, pelo menos, acho que tenho.

Amanhã tudo continua, depois de alguns dias a poeira baixa, a gente consegue desfazer a mala, lavar a roupa, arrumar o quarto, descarregar as fotos, acalmar as trocas de scraps, arquivar os papéis, e a vida começa a retomar o curso. Não tenho a menor pressa de fazer tudo isso, a palavra de ordem agora é deixar as coisas acontecerem. Se for pra ter pressa de alguma coisa, é pra colocar em prática as ideiazinahs que estão piscando agitadas no meu cérebro. Escrevo como um compromisso, para não esquecer de tudo o que tenho que fazer, das cartas que quero escrever, dos livros que preciso ler, das conversas que pretendo ter, dos dias que pretendo tornar mais proveitosos.

E aquilo que hoje me deixa angustiada e até um pouco triste, as saudades de tudo aquilo que não coube em uma semana, talvez acalme. Me disseram que o N é bom porque acaba, acho que estou começando a entender porquê. Se não tivesse prazo, talvez fosse menos intenso, eu mesma disse que só sou inteira quando sou estranha.

Fica assim então, a vida invandindo o quarto, ansiosa por continuar. Um dia pra arrumar as coisas, outro pra comprar os livros, outro pra trocar as fotos, e eu sei que as saudades vão diminuir, eu sei que não é a primeira nem a segunda vez... E aquilo de que eu sinto falta talvez esbarre comigo perto de casa, numa tarde qualquer. Ou talvez eu esbarre com ele sabe-se lá onde e decida mudar tudo. Cada pode ser surpreendente e eu não vou me esforçar pra adivinhar o que está por vir. Voltei a ser prolixa o suficiente pra me cansar de escrever antes do fluxo de idéias se esgotar. Pra falar a verdade, espero que ele não se esgote nunca, apenas ganhe corpo e quem sabe um dia me leve a algum lugar. Assumindo a repetição, eu sempre quero chegar a algum lugar, parece que há em mim uma sina do moto contínuo que não me permite ficar muito tempo num mesmo lugar, e evidentemente não me refiro apenas a lugares físicos. Essa inquietude já me rendeu crises e noites de insônia, complexos de incompetência, mas agora eu prefiro achar que cada um tem seus meios de crescer e é muito mais importante tentar entender os que apontam a sua natureza do que tentar se encaixar nos parâmetros alheios.



São muitas, muitas as reflexões, o corpo do texto chega a ficar confuso. Mas isso é só um pouco da bagunça que os últimos dias instalaram em mim. Os responsáveis que vistam a carapuça e se manifestem, caso passem por aqui. Aceito cartões postais, telefonemas e quaisquer outras lembranças. Também me deixarão contente manifestações dos que se identificarem com tudo isso. Mas se ninguém falar nada também não há mal nenhum. Eu escrevi isso tudo me focando apenas na minha percepção subjetiva mesmo, e admito que não há muita qualidade literária no que acabou de sair. Publico apenas por um compromisso que assumi comigo. Que conste como registro de um momento muito feliz e muito confuso, e como exercício, sem falar nos lembretes e referências camuflados, que faço questão de não perder.

O resto, veremos depois